Um longo e amargo adeus
Jorg Haider sacudiu como ninguém, nos anos oitenta, uma política austríaca enfadonha, pantanosa e dirigida por toupeiras pró-soviéticas (alguém se lembra do repulsivo Bruno Kreisky?) e chocou, posteriormente, a mornidão do politicamente correcto que há muito se instalara nesse País e na Europa.
Era uma personagem controversa e não foi imune a erros.
A sua irreprimível falta de continência verbal, fazendo dispensáveis apreciações histórico-humorísticas de carácter público (caso das Waffen SS e da política de emprego do Hitler) que depois se voltaram previsivelmente contra ele, levaram os opositores a satirizar que, se alguém o quisesse assassinar, teria também de matar a sua boca em separado.
Como táctico, cometeu também alguns lapsos dispensivos. Após o seu triunfo eleitoral em 1999, celebrou uma coligação com os democratas-cristãos do ÖVP (que batera por alguns milhares de votos) e aceitou confiar àqueles, a Chancelaria e não integrar pessoalmente o Governo como nº 2. O resultado foi: o total domínio do governo de coligação pelo ÖVP; a irrupção intermitente de críticas perturbadoras que não resistiu em lançar ao Governo e aos ministros do seu próprio Partido (o FPÖE) como “comentador político” (instalado na chefia do Land da Caríntia); e uma gravíssima cisão que propiciou nesta formação e que a atirou para os 10%.
Todavia, no seu notável “activo”, Haider conseguiu tomar de assalto e refundar um pequeno partido do centro-liberal, elevando o score de 5% que aquele obtivera em 1986, para 27% em 1999 e conseguindo quebrar o “gueto” onde o establishment confinara a direita radical e nacionalista, fazendo-a entrar numa coligação com os paridos do sistema.
Para além de ser, a nível europeu, o responsável por um “aggiornamento” das correntes nacionalistas da direita radical (transformando-as em partidos de massas com vocação de governo e não em pandilhas de cabeças rapadas), marcou também a agenda política austríaca e europeia com as suas propostas corajosas em matéria de imigração, segurança interna, preferência no emprego a nacionais, defesa de políticas sociais e apoio às pequenas e médias empresas.
Dado como morto politicamente quando saiu do partido da Liberdade e fundou o seu próprio partido, o BZÖ, que obteria apenas 4% nas penúltimas eleições, Haider, a partir do seu governo da Caríntia que manteve com mais de 40% dos votos, renasceu e conseguiu uma subida notável nas últimas eleições de há duas semanas atrás, com quase 11%.
A sua morte estranhíssima, prematura e trágica, enluta as modernas correntes nacionalistas europeias que muito devem às suas ideias, força, imagem e tenacidade.
Nos últimos dias, antes de morrer, terá enterrado o machado de uma guerra muito “feudal” que vinha travando com o antigo discípulo, Strache, o líder do Partido da Liberdade (de quem se encontrava há muito afastado, depois de aquele ter derrotado a sua irmã, na chefia do FPÖE). Heinz Strache, também ele um populista com apoio esmagador na juventude e operariado de Viena, lidera com quase 18% a direita nacionalista e é o óbvio candidato a primeiro-ministro no futuro. Falou-se então numa possível coligação ou união entre os dois partidos.
O BZÖ sem Haider não será o mesmo, já que o partido tem sido, sobretudo, “one man show”. O novo Presidente interino, Petzner, um jovem secretário-geral de apenas 27 anos, dificilmente conservaria uma liderança estável, atendendo ao facto de figuras mais experientes terem ambições ao lugar como Westenhaller (líder Parlamentar que já ocupou o lugar de presidente), Dörfler (novo Governador da Caríntia e candidato potencial a lider) e a irmã de Haider, Ursula Haubner. Os maiores riscos, no momento, não serão, contudo, uma ruptura imediata (porque o BZÖ é um pequeno clube de amigos), mas sim uma tentação de a nova direcção órfã vir a ajudar a formar uma coligação do bloco central com o SPOE e o ÖVP. Nesse caso o partido seria deglutido nesse mesmo bloco central.
A prevalecerem figuras que não Ursula Haubner, será possível, a prazo, outras soluções, tais como: uma fusão com o FPÖE; uma união com este partido semelhante à CDU/CSU ( com o BZÖ como partido do ramo caríntio); ou uma coligação. Se tal vier a ocorrer e caso se confirme a reedição do bloco central nos actuais tempos de catástrofe financeira, a Direita Nacionalista austríaca na oposição venceria com grande probabilidade as próximas eleições, que se prevêem antecipadas.
Tal constituiria, seguramente, a maior vitória póstuma desse bravo e notável líder europeu que foi Haider e cujo desaparecimento nos deixa o sentimento amargo que são sempre os melhores que partem prematuramente.
5 Comentários:
Adeus sentido a um patriota. Que descanse em paz.
excelente análise.
os meus parabéns
Rui Santos
Morte "estranhíssima" deveu-se, muito prosaicamente, a um grande pifo. É o próprio partido que o confirma
É verdade, admito. Quando escrevi o comentário, o "Cabaret" discoteca de Velden que conheço, tinha dito que Haider só tinha bebido um copo de espumante.
O que é preciso é sacudir - não interessa o quê nem para quê. Sacudamos, pois.
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